Quando Itamar Franco assumiu o governo com o impeachment de Collor de Melo, não houve qualquer contestação à sua legitimidade, apesar de, como Michel Temer, também ter sido eleito, por força da Constituição, na esteira dos votos do titular. Quando José Sarney assumiu o governo diante da tragédia da morte do titular eleito, anos antes, as dúvidas sobre sua legitimidade para tanto restringiram-se a algumas discussões no campo jurídico, já que Tancredo não havia chegado a tomar posse. Em nenhum desses casos houve manifestação de rua contraria ao exercício da presidência pelo vice. Explica-se facilmente: no caso Collor havia uma quase unanimidade no país quanto ao desejo de sua queda, já que a população, além de convencida pela imprensa de que o presidente estaria envolvido em corrupção (o que jamais se comprovou), a situação econômica com o fracasso do malfeito e mal executado Plano Collor era caótica; no caso Tancredo, o destino despejara a tragédia política na cabeça de todo o povo brasileiro, praticamente sem qualquer exceção, quando Tancredo, eleito, ainda que pelo Colégio Eleitoral criado pelos militares, e sem qualquer rompimento com o status quo, já que o poder estava passando das mãos dos militares para os civis de forma absolutamente pacífica e natural, sem trauma político institucional, fora internado na véspera do dia da posse e viera a morrer pouco mais de um mês depois. A imprensa, também, não fez qualquer pressão em sentido contrário à posse de Sarney, já que temia uma crise institucional que fizesse com que os militares repensassem a transição que se gestava desde que o general Figueiredo assumira a presidência 6 anos antes. No caso Dilma/Temer, contudo, há uma sociedade claramente dividida, como se viu não nas manifestações de grupos liderados pelo PT, que seria natural, mas na própria classe média alta, como demonstraram os panelaços da noite do último domingo, quando o ainda vice Michel Temer, que ocupa, por enquanto, provisoriamente, a cadeira que os votos de 2014 deram a Dilma, dava sua entrevista ao programa Fantástico da Globo. Essa parcela da sociedade não está contra a saída de Dilma ou do PT, mas contra a assunção do poder por Temer e seu PMDB, que reputa como ilegítima porque não teve o voto das urnas – e, também, por envolvimento de membros do partido nos casos de corrupção que estão sendo investigados pela Polícia Federal sob os comandos do juiz Sergio Moro e do STF. Os vices surgiram porque, fora do país ou adoentados, os titulares não tinham como exercer o comando. Houve um tempo em que eram eleitos independentemente do titular, como ocorreu até 1960, quando o último vice brasileiro, João Goulart, fora eleito dessa forma. Depois, passaram a integrar uma chapa, tal como as dos suplentes de Senador, e, de fato, não são os donos dos votos que os levaram ao cargo. Num mundo totalmente integrado pelos sistemas de comunicação imediatos e ao vivo, o titular comanda o país de onde estiver. Se impossibilitado por doença, por exemplo, pode ser substituído temporariamente pelo presidente da Câmara, como ocorreu na época, por exemplo, de Sarney, que não tinha vice e nem por isso o Brasil foi invadido por forças estrangeiras. Em caso de vacância, novas eleições poderiam ser realizadas, sem qualquer trauma político institucional. Talvez esteja na hora de repensarmos essa talvez desnecessária figura dos vices.
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