A Manchester Sul Mineira. Assim Itajubá foi conhecida entre os anos 1930 e final da década de 1960, numa referência a Manchester, cidade inglesa que, no Século XVIII tornou-se mundialmente famosa por ser parque industrial têxtil. Se, depois de alguns anos de decadência industrial, Itajubá tornou-se uma potência da indústria tecnológica a partir do final da década de 1970 até os dias atuais, foi no passado que tivemos os grandes “capitães de Industria”, como eram conhecidos os proprietários de unidades industriais de peso, geralmente indústrias familiares, como, em São Paulo, destacavam-se os Matarazzo. Nesse capítulo de uma série em que o Itajubá Notícias homenageia alguns dos grandes vultos do passado, lembraremos algumas das nossas fábricas e seus “capitães”, que fizeram nossa História.
Alcides Faria – Têxtil Faria & Faria Ltda
Por algum motivo, até o final dos anos 1960 as unidades industriais seguiam um padrão de construção inglês. Tijolos à vista, normalmente pintados de vermelho, com cobertura dividida em várias partes como triângulos retângulos. Se o leitor não consegue visualizar um prédio assim, basta ir ao bairro da Varginha, na Rua José Joaquim, bem em frente ao Colégio Estadual João XXIII, e admirar o preservado prédio da Industria Têxtil Faria & Faria, criada por Alcides Faria, que manteve-se à sua frente desde 1925 até o início da década de 1980, quando a fábrica foi vendida para o grupo Oliveira Industrial. Ao lado da fábrica, três vilas de casas populares construídas pelo próprio industrial serviam de moradia para seus funcionários. Foi também fazendeiro e político, tendo sido um dos maiores pecuaristas do Sul de Minas. Na vida política, foi vereador entre 1908 e prefeito entre 1937 e 1945. Casado com Dona Albertina Pinto Faria, comprou de Dona Amélia Braga a mais bela mansão que Itajubá conheceu, localizada na Praça Theodomiro Santiago, onde viveu até sua morte, e que, na segunda metade da década de 1970, foi vendida por seus herdeiros para João Corrêa Pinto, que também ali residiu com sua família até que seus herdeiros também a venderam a uma incorporadora que a demoliu e construiu o atual Edificio João Corrêa Pinto.
Manoel Valente Pereira – Doces Vera Cruz
Quem passava pela antiga ponte de arcos que ligava os dois lados do Rio Sapucaí até a década de 1980, não se esquece até hoje do cheirinho de goiabada ou marmelada, que vinha da fábrica da Vera Cruz. Manuel Maria Valente Pereira nasceu no ano de 1908 em Ovar, cidade litorânea de Portugal, filho do carpinteiro e arrendatário de terras Francisco Valente Pereira e de D. Rosa Emilia Rodrigues Pereira. Aos 16 anos veio para o Brasil fixando-se no Rio de Janeiro onde teve vários empregos, até se empregar na Indústria Alimentícia Colombo, especializada em doces, compotas e geléias. No final da década de 1930, foi mandado por seus patrões para Maria da Fé, para supervisionar a produção de polpas de frutas para a Colombo, casando-se com Ana Corrêa Cardoso, indo morar em São Paulo, retornando menos de um ano depois, quando fundou, ainda em Maria da Fé, juntamente com seu sogro, uma fábrica de polpas de frutas para doces, mais tarde a icônica Fábrica de Doces Vera Cruz, já instalada em Itajubá, agora juntamente com seu irmão Francisco Valente Pereira e outro parente chamado José Valente, que logo deixou a sociedade. A fábrica funcionou na Rua Capitão Rennó, próximo onde hoje é o Restaurante Sem Nome, até que foi construído o prédio ao lado do Rio Sapucaí, na saída da antiga ponte de arcos Randolfo Paiva, onde existe hoje uma agência bancária. Na primeira metade da década de 1980, a fábrica, cujo único proprietário era Francisco Valente Pereira, depois da morte de Manoel Valente Pereira em 1971, fechou suas portas e desligou suas caldeiras, o terreno foi vendido para o banco que, ao demolir o enorme prédio, resolveu preservar a sua chaminé que ali está até hoje.
Marcilio e Orlando Ferrini – Massas Ferrini Ltda
Localizada na Av. Silvestre Junqueira Ferraz, bairro Boa Vista, num prédio que ainda existe, mas sequer aparenta ter sido a sede de uma grande indústria itajubense, a Irmãos Ferrini Ltda abasteceu as mesas das famílias itajubenses e da região com muito macarrão nos almoços de domingo. Tudo começou na segunda década do século passado, quando Pompílio Ferrini chegava a Itajubá com sua família com a missão de iniciar as atividades de uma fábrica de macarrão que pertencia a José Teotônio. Pouco tempo depois, com maquinário de segunda mão, deu início à sua própria indústria, criando a Pompilio Ferrini e Filhos, mas, quando o Brasil começou a se alinhar aos aliados na 2ª Guerra Mundial, o governo brasileiro confiscou todos os bens de estrangeiros italianos, japoneses e alemães. A fábrica passou aos brasileiros Marcílio e Orlando Ferrini, filhos de Pompílio, nascendo a firma Irmãos Ferrini Ltda, fabricando macarrão desde 1943. A guerra chegou ao fim, e a Irmãos Ferrini adquiriu novas máquinas, agora já italianas, mas um incêndio em 1959 as destruiu, mas não a vontade dos Ferrini de prosseguir com sua indústria. Compraram máquinas usadas brasileiras e retomaram a produção. Em 1979,um novo incêndio, paralisação da fábrica, que somente retornou suas atividades em 1980. No entanto, apenas oito anos depois, falecia Orlando Ferrini, tendo seu genro assumido suas cotas na sociedade. Com produção na casa das oito toneladas diárias, chegou a 18 toneladas, quando, em 2001, faleceu Marcilio Ferrini, terminando a tradição de uma família de industriais das mais icônicas na região.
Wenceslau Bráz Pereira Gomes – Codorna
O nome de Wenceslau Brás remete ao itajubense que foi presidente da República entre 1914 e 1918, num dos períodos mais difíceis para o mundo, que vivia a 1ª Guerra Mundial e enfrentava a Febre Espanhola. Mas o grande Wenceslau Bráz Pereira Gomes não foi, apenas, um político: era também um grande empresário e até mesmo banqueiro, um dos criadores da Cia. Industrial Sul Mineira, que se dividia em setor bancário, setor de energia e setor industrial têxtil, esse denominado popularmente a conhecida Codorna, e o setor bancário, o Banco de Itajubá. A indústria localizava-se num amplo prédio típico industrial, na Rua Dona Maria Carneiro, onde hoje há um shopping e outras unidades comerciais, que começava logo após onde hoje está o prédio do Hotel Bramig e seguia até a Av. Capitão Gomes, ocupando uma área de mais de 10.000 metros quadrados, incluindo, na sua ponta na Av. Capitão Gomes, o Clube Operário, dos funcionários da fábrica. No bairro Boa Vista e no bairro Avenida, haviam vilas de casas construídas pela fábrica para seus funcionários. O banco funcionava no prédio onde, mais tarde, passou a ser o Banco da Lavoura, o Banco Real, o banco ABN Amro, e, atualmente, o Santander, na esquina com da Rua Silvestre Ferraz com o calçadão da João de Azevedo, no centro. Mas aqui e agora, vamos falar sobre a indústria têxtil Cia. Industrial Sul Mineira, ou Codorna, a maior da época na nossa região, que chegou a ser tema de uma tese de mestrado defendida por Luciene Peixoto Taveira, na PUC-SP, em 2009, onde, aliás, fomos buscar a maioria das informações desse texto. Fundada em 1914, a Codorna foi originalmente criada por João Carneiro Santiago Júnior, sogro de Wenceslau Brás, e empregou milhares de itajubenses – principalmente mulheres – ao longo de sua existência de mais de 50 anos de atividades. Seu prédio, hoje já inexistente, foi objeto de duas tentativas de tombamento, em 1997 e 1998, durante a gestão do então prefeito José Francisco Marques Ribeiro, pelo patrimônio histórico, mas o processo jamais foi concluído, permitindo que, aos poucos, fosse sendo demolido ou, simplesmente, viesse ao chão até desaparecer na última década. A Codorna entrou em declínio diante da concorrência de industrias têxteis modernas na década de 1960, vindo a fechar suas portas em 1966, exatamente no mesmo ano em que falecia o ex presidente e seu cocriador Wenceslau Brás Pereira Gomes.
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